Governo joga tudo na camuflagem do País real

Esconder problemas<br>e vender ilusões

O fim das quotas leiteiras em Março tem consequências dramáticas para os agricultores e a produção nacional. Quem o diz é o PCP, que adverte que o País poder passa da condição de auto-suficiente para «forte importador de leite», com destruição de explorações e de empregos.

Há um fosso a separar o País inventado pelo Governo e o vivido pelos portugueses

O tema foi levado ao plenário da AR no dia 25 pelo deputado comunista João Ramos e serviu para ilustrar, entre vários outros exemplos centrados na agricultura e no turismo, como o Governo procura esconder para debaixo do tapete os problemas concretos com que o País se confronta, semeando ilusões com intuitos eleitorais.

Entre o País inventado pelo Governo e o País vivido pelos portugueses há um mar a separá-los, disse o parlamentar do PCP, pegando na campanha de marketing sobre o alegado sucesso da política agrícola, dirigida já não ao sector (porque esse conhece e sente bem as dificuldades) mas aos portugueses que em geral estão mais afastados da realidade do mundo rural.

«Será um sucesso sim mas para o agro-negócio, para a grande agricultura de cariz industrial, que recebe milhões em apoios públicos (60 empresas agrícolas recebem tanto como as 120 mil explorações mais pequenas), orientada para a exportação e tantas vezes associada a mão-de-obra imigrante e barata», sublinhou João Ramos, que, em contraponto, mostrou como a agricultura que produz para consumo interno e de proximidade, essencial para fixar as pessoas no território e combater o despovoamento do interior, essa, «atravessa as maiores dificuldades». Testemunho disso mesmo são os preços de ruína pagos ao produtores, com o leite a ser por estes vendido a 30 cêntimos/Kg ou a batata vendida a cinco cêntimos/Kg, havendo produções que são entregues sem qualquer preço à cabeça, como a uva e as frutas.

Mas também nos programas de apoio comunitário é notória a existência de um tratamento desigual, como acontece com o novo Programa de Desenvolvimento Rural (PDR 2014-2020), em que se verifica uma distinção entre os grandes agricultores, claramente beneficiados, e os pequenos, que «ficam cada vez mais afastados dos apoios».

Ao lado dos grandes

Situação gravemente discriminatória que de resto não constitui uma novidade, vinda de um Governo que está sempre ao lado dos grandes interesses e contra os pequenos e médios produtores. Opção que não é de hoje e que está bem expressa - e estes foram exemplos referidos pelo parlamentar comunista - quando o Governo tira a gestão de secadores de arroz a rendeiros para a dar a grandes proprietários, quando quer acabar com a Casa do Douro como representante da lavoura duriense para a entregar ao controlo da comercialização e da CAP, quando

quando persegue e tira terra a rendeiros do Estado na Herdade do Machados, ou quando obriga pequenos produtores a colectarem-se mas não impõe limites à grande distribuição.

Tudo isto num quadro em que o Ministério da Agricultura se encontra «completamente desmantelado», assinalou João Ramos, que criticou ainda os atrasos nos pagamentos às equipas de sapadores e à sanidade animal, através das organizações de produtores pecuários (OPP).

Daí a consideração de que não é iludindo (como faz o Governo) que os problemas se resolvem, mas sim enfrentando-os através de uma política que aposte no «aumento da produção para dever menos», valorizando o trabalho, os pequenos e médios agricultores, promovendo o preço justo pago aos produtores, «fazendo prevalecer o interesse nacional e defendendo o sector leiteiro nacional face às imposições de Bruxelas».


Ganhos vão só para alguns

Inundar o discurso com propaganda como forma de dissimular os problemas é ainda o que faz o Governo quando se trata de abordar a área do Turismo. Uma prática que de resto é comum à maioria parlamentar que o sustenta, como agora mesmo se viu pela sua reacção à declaração política do PCP, com Pedro Lynce (PSD) a rasgar elogios ao desempenho «francamente bom» do Governo e Abel Baptista (CDS-PP) a atestá-lo invocando os «dois milhões de dormidas» de turistas registados em Janeiro.

Mistificação que João Ramos desmontou com eficiência ao trazer ao lume a outra face da realidade que não entra nos chavões que alimentam a máquina de propaganda do Governo do PSD/CDS-PP.

Diz este, por exemplo, que o País alcançou em 2014 o «melhor ano turístico de sempre», mas esconde os elementos que demonstram a desigualdade regional desse «sucesso», observou o parlamentar do PCP, acusando o Executivo de passar ainda ao lado desse outro dado não menos significativo que é o de mais de 60 por cento das empresas de Alojamento e Restauração com dívida financeira serem incapazes de gerar rendimentos antes de impostos suficientes para pagar os juros. Tal como finge ignorar que são mais de 25 mil os empregos perdidos no último ano ou que o número de trabalhadores a receber o salário mínimo nacional no sector é quase o dobro da média nacional.

E é por estas razões que os trabalhadores erguem a sua voz e lutam, como no Porto, em Braga, em Lisboa, na Madeira e, ainda na passada semana, no Clube da Praia da Rocha, no Algarve, onde o desespero gerada por salários em atraso levou uma trabalhadora a acorrentar-se nas instalações do empreendimento. «É este o sucesso do Governo. Basta haver mais proventos, não interessa quem os acumula nem se ficam salários em atraso», verberou João Ramos, anotando que para haver «melhores anos turísticos de sempre» os salários têm de ser valorizados e pagos a horas, a riqueza criada tem de ser distribuída com justiça pelos trabalhadores, a «precariedade erradicada e as condições de trabalho melhoradas».

 



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